Já andava a catrapiscar o livro há uns dias; depois de ler este post do Eduardo Pitta comprei-o. Gosto de uma boa biografia, mas os auto-exercícios do género apresentam-se-me, regra geral, muito sentimentais, omissos e auto-justificativos. Não é o caso do de Eric Hobsbawm: quem quer que leia Tempos Interessantes. Uma Vida no Século XX (Campo das Letras, 2005) não pode deixar de reconhecer uma atípica capacidade de distrinça entre a fé política e o balanço dos seus resultados, entre a identificação das motivações emocionais da acção e a racionalização a posteriori das mesmas, entre a relevante medida da participação política, académica, social e a irrelevante exposição dos pormenores da vida íntima. Particulamente importante é, parece-me, o facto de Hobsbawm laborar com base na (não tão óbvia e aceite como se possa pensar) noção do devir da vida humana como coisa cumulativa, mais que eliminatória. Sem ela, e sem um minucioso exercício de abstracção e honestidade, como enfrentarmos quem éramos há vinte, quarenta, sessenta anos atrás?
A quem recentemente se iniciou no ofício da História, o decano oferece um heads up:
"As pressões políticas que a história sofre por parte dos Estados e dos regimes novos e antigos, dos grupos identitários e de forças durante muito tempo escondidas sob a camada de gelo da guerra fria, são ainda maiores que as que conheci ao longo da minha vida, e a moderna sociedade mediática conferiu ao passado um destaque e um potencial mercantil sem precedentes. A história está a ser revista ou inventada, hoje mais que nunca, por pessoas que não desejam a verdade do passado, mas apenas um passado que se adeque aos seus objectivos. A época actual é a grande época da mitologia histórica. A defesa da história pelos seus profissionais é hoje, politicamente, mais urgente que nunca. Somos necessários."
(cf. p.389)
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